Tortura nunca mais!, por Maycon Gomes

26 de Junho é o Dia Internacional de Apoio às Vítimas de Tortura, instituído pela ONU em 1997, com intuito de criar solidariedade para com as vítimas de tortura e extinguir sua prática tenebrosa.

Na história moderna, a tortura é aplicada sistematicamente como política de repressão e investigativa. Na América do Sul, a tortura foi exercida por TODOS os regimes militares, durante o século XX.

No Brasil, não foi diferente. Herança da Inquisição, a tortura esteve presente na escravidão, sendo aplicada durante todo o período colonial de modo a castigar os prisioneiros, durante o império e também no período republicano.

À partir do golpe de 1964, durante os anos de chumbo, a tortura foi amplamente utilizada pela ditadura militar, principalmente após a instauração do Ato Institucional número 5 – AI-5.

A tortura voltou ao centro das atenções recentemente quando o atual presidente da república, Jair Bolsonaro, revelou em entrevista que seu livro de cabeceira é um livro escrito pelo carrasco, digo, coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que respondeu por crime de tortura em tribunal militar, no ano de 2006.

Pau de arara, cadeira do dragão, afogamento, choque elétrico, empalamento, ratos, estupro, cuspe, esperma, urina, palmatória, sangue e terror psicológico entre outras brutalidades – por vezes letais – foram utilizadas contra os presos políticos, geralmente nos porões do DOPS, DOI-CODI, e bases militares das forças armadas.

A tortura caracteriza-se como crime contra a humanidade, e é facilitada pela anomia do Estado de Exceção, mas também é varrida para debaixo do tapete no Estado de Direito.

Com a redemocratização, em 1985, as práticas  torturantes deixou de ser usada para fins políticos, porém a polícia continuou se valendo das técnicas de tortura contra presos comuns, principalmente contra os pobres, negros e indígenas.

Por que falar de tortura?

E por que é importante revisitar lembranças tão dolorosas da nossa história? Em tese a resposta é simples: é porque a verdade liberta.

Muito do que foi esclarecido do período da ditadura, se deve aos esforços da Comissão Nacional da Verdade e Grupo Tortura Nunca Mais, pois sabemos que o Brasil é um país mal resolvido com o seu passado.

As falhas da nossa educação levaram o povo brasileiro a desconhecer períodos sombrios da nossa história e com a tão famosa cordialidade evitamos tocar na ferida, mas não obstante ela deixou de sangrar.

As vítimas e suas famílias continuam sangrando. E enquanto não houver uma reflexão consistente e uma educação honesta sobre este tema espinhoso, os fantasmas continuarão a nos assombrar. Mas até quando?

Precisamos ler Maria Rita Kehl, que analisa sob o ponto de vista da psicanálise, a relutância de setores da sociedade brasileira em encarar os podres da nossa história gerando o equivalente a uma neurose no nosso povo.

O Brasil é um país que precisa urgentemente deitar no divã e deixar de relativizar assuntos tidos como tabus, só assim começaremos a curar os traumas, evitar as neuroses e enfim dizer “tortura nunca mais!”.

*Maycon Gomes é formado em Ciências Sociais pela PUCCAMP e Conselheiro Tutelar em Lindoia

Foto: (Divulgação / Reprodução) O Monumento Tortura Nunca Mais, no Recife, foi o primeiro monumento construído no país em homenagem aos mortos e desaparecidos políticos brasileiros, e apresenta o corpo de um homem nu em posição da tortura de pau de arara.

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https://www.tribunadasaguas.com.br/2021/06/25/fim-ao-deixa-estar-por-celso-antunes/